13.10.12
Ironia da história !
Carlos Alberto Sarderberg
Vamos
falar francamente: os jovens da esquerda revolucionária dos anos 60 e
70 nunca lutaram pela democracia.
Não, pelo menos, por esta que temos
hoje e que vem sendo aperfeiçoada desde 1985.
Todos
que participaram dos partidos, movimentos, vanguardas e alas daquela
época sabem perfeitamente que se lutava pela derrubada do capitalismo e
pela implantação aqui de um regime tipo cubano.
E, se não quiserem ou não acreditarem em depoimentos pessoais, basta consultar os documentos produzidos por aqueles grupos.
Poderão,
então, verificar, que a única grande divergência entre eles estava
no
processo.
Para alguns, a revolução comunista viria pela guerrilha a
partir do campo, no modelo cubano.
Para outros, o capitalismo seria
derrubado pela classe operária urbana que se formava no Brasil em
consequência do próprio desenvolvimento capitalista.
Derrubar
o regime dos militares brasileiros não era uma finalidade em si.
Aliás,
alguns grupos achavam que a instauração de uma “democracia burguesa”
seria contraproducente, pois criaria uma ilusão nas classes oprimidas.
Estas poderiam se conformar com a busca “apenas” de salários,
benefícios, casa própria, carro etc., em vez de lutarem pelo socialismo.
Pois
foi exatamente o que aconteceu. E, por uma dessas ironias da história,
sob a condução e a liderança de Lula!
Uma vez perguntaram a Lula, preso
no Dops de São Paulo: você é comunista? E ele: sou torneiro-mecânico.
Uma
frase que diz muito. De fato, o ex-presidente jamais pertenceu à
esquerda revolucionária. Juntou-se com parte dela, deixou correr o
discurso, mas seu comportamento dominante sempre foi o de líder sindical
em busca de melhores condições para os trabalhadores da indústria.
Líder
político nacional, ampliou seu objetivo para melhorar a vida de todas
as camadas mais pobres, não com revolução, mas com crédito consignado,
salário mínimo e bolsa família, bens de consumo e moradia, churrasco e
viagens. Tudo pelas classes médias.
Mas
por que estamos falando disso? Certamente, não é para uma cobrança
tardia.
É por causa do julgamento do mensalão, mais exatamente por causa
das reações de José Dirceu, José Genoino e tantos outros membros do PT.
Os dois ex-dirigentes condenados deram notas escritas, cujo conteúdo tem dois pontos contraditórios.
De um lado, tentam passar uma ilusão, a de que lutavam pela democracia desde os anos 60.
De
outro, desqualificam essa democracia ao dizer que a decisão do Supremo
Tribunal Federal, poder central no regime democrático, foi um julgamento
de exceção e de ódio ao PT, promovido por elites reacionárias que
dominam a imprensa e a Justiça.
Eis o velho discurso: a democracia é burguesa, uma farsa que só favorece os ricos.
Ao
mesmo tempo, dizem que a vida do povo, dos mais pobres, melhorou e
muito sob o governo do PT.
Ora, em qual ambiente o PT cresceu, o
presidente Lula ganhou e governou? Nesta nossa democracia que, entre
outras coisas, levou a este extraordinário momento: Lula e Dilma
indicaram os juízes do STF que condenaram Genoino e Dirceu.
O
movimento estudantil dos anos 60 e 70 foi uma tragédia.
Foram para a
política os melhores rapazes e moças.
E a política, por causa da
ditadura local e da guerra fria global, e mais a ideologia esquerdista
então dominante na intelectualidade e na academia, levou à luta armada.
Tratava-se
de um tremendo engano político. Como acreditar que uma guerrilha dentro
da floresta amazônica poderia terminar com a tomada do poder em
Brasília?
Estava
claro que a nova classe operária, como os trabalhadores da indústria
automobilística, com seu líder Lula, sequer pensava em Cuba, mas sonhava
com o padrão de vida dos colegas de Detroit. E os sindicalistas, com
posições no governo.
E
assim, jovens idealistas e com o sentimento de dever, perderam a vida,
foram massacrados em torturas, banidos pelo mundo, famílias arrasadas.
É
um milagre que tantos deles tenham conseguido recolocar de pé a vida e
estejam aí prestando serviços ao país.
Mas
não serve para nada tentar esconder essa história. Em vez de tentar
mudar o passado, melhor seria uma revisão, uma crítica serena,
favorecida pelo tempo passado. Mesmo porque, sem essa crítica, ocorrem
as recaídas que, estas sim, podem perturbar o ambiente político.
Felizmente, a democracia, modelo clássico, de Ulysses, Tancredo, Montoro, venceu, não sem uma ajuda dos jovens dos anos 60 e 70.
Ironia da história !